
Foi no Amazonas de tantas histórias e lendas que começou a saga de uma mãe brasileira. Mary, já tinha perdido um bebê e o filho que teve anos depois parecia condenado ao mesmo destino.
“Quando ia dar o leitinho pra ele, ele parava, fechava os olhos e faltava respiração, ele parava”, disse a mãe do Miguel, Francimary Prudente da Silva.
Miguel era até gorduchinho, mas logo apresentou as sequelas de uma doença rara e grave: leucinose. Ele não produz uma enzima que ajuda processar a proteína. Uma enzima que está presente em vários órgãos, como o fígado, rins e músculos. O sistema nervoso e muscular de Miguel ficou fragilizado.
“Essa criança desde o começo tem que fazer um diagnóstico precoce, já no primeiro mês de vida, porque a doença começa já no primeiro mês”, disse a hepatologista pediátrica Gilda Porta.
Sem conseguir engolir, Miguel só se alimentava com um leite especial caro. Mesmo assim ele não se desenvolvia.
“Nem com apoio ele não sentava. O Miguel não ficava em pé, não interagia”, conta a mãe.
A solução estava longe de casa: um transplante de fígado. Mary não teve não dúvida.
“Sabe aquela decisão de que sou eu vou doar, eu vim preparada pra doar”, disse a mãe.
Mas para doar uma parte do próprio corpo e salvar a vida do filho Meire precisaria antes passar por mais uma prova de força e determinação: perder cerca de 20 quilos num curto espaço de tempo
Ela cortou doces, reduziu massas, comeu muita salada, muita sopa e fez muita corrida na esteira.
“Final de agosto eu já estava bem, eu já tava com 64, 63 quilos eu estava. Eu disse: ‘Ah não, eu quero ficar em 60’, porque eu fui gostando”, disse Mary.
Mary estava pronta para o transplante quando aconteceu a grande surpresa dessa história.
“A Vera, enfermeira, me liga e diz ‘Francemary, eu estou ligando para dizer que vai acontecer o transplante do Miguel na semana que vem’, aí nesse dia eu chorei, chorei, chorei... Porque aí quando ela falou assim ‘e aí o fígado do seu filho vai para outra criança.’ Aí eu disse: como pode? Mas não, eu perguntei dela. Eu disse: é? Ela disse: ‘é. O fígado do teu filho não serve pra ele, mas serve para outra criança’”, conta a mãe de Miguel.
Foi nesse ponto que a saga de Mary e Miguel se cruzou com a de Gisele e Alan. Ele veio de Cuiabá, porque nasceu com um entupimento das vias biliares, o problema no fígado se agravou com o tempo. Sem um transplante rápido ele não resistiria.
“Na hora você não sabe quem pode doar, se acha um doador”, disse a mãe de Alan, Gisele Viera dos Anjos.
O doador seria Miguel.
No centro cirúrgico a história da Mary, do Miguel e do Alan se transformou também em um marco na história dos transplantes. O que aconteceu no dia 31 de outubro de 2012 ainda não tinha registro na literatura médica.
“É a primeira vez em que isso ocorre, a mãe que tem o gene da doença, mas não está doente, não tem doença do fígado, doar uma parte do seu fígado para o filho dela, para o Miguel, isso é inusitado, não existe caso como esse”, disse o coordenador do Programa de Transplante de Fígado, Paulo Chapchap.
Fantástico: E a decisão de doar o fígado do Miguel para o Alan?
“Então, a gente viu a oportunidade de usar este fígado do Miguel, que é normal em tudo menos pela falta da enzima, para o Alan que produz enzimas em outros órgãos”, conta o médico.
O transplante dominó feito pelo SUS no Hospital Sírio Libanês começou às sete da manhã e terminou às dez da noite com médicos e enfermeiros trabalhando ao mesmo tempo em três salas de cirurgia.
“Você termina o transplante e se sente feliz, mas na verdade os problemas estão apenas começando, porque no dia seguinte você tem que ver os exames, ver se está tudo bem com os dois pacientes e com a doadora”, diz o médico cirurgião João Seda.
Quatro meses depois e os exames confirmaram que está tudo muito bem com Alan. “Ele está completamente normal”, revela a médica. E com Miguel também. “Ele está ótimo”, conta.
Tão bem que a médica dá uma notícia muito esperada
“Nós já estamos em vias de você ir embora para Manaus, né?”, disse a médica.
“Eu fico super emocionada. Ficar 9 meses aqui, praticamente 9 meses, né. Eu fico feliz”, conta a mãe do Miguel .
O Fantástico matou um pouco dessa saudade e montou uma conexão via internet para o seu Manoel lá de Manaus poder ver a Mary e o Miguel em ação finalmente. O bebê que antes só ficava deitado, mostra que está se desenvolvendo, se agita...
“Bate palminha pro papai, olha que felicidade”, diz a mãe.
“Ele está danado demais, né?”, diz o pai. Lá, a saudade também aperta. “Não vejo a hora deles chegarem, pra abraçar, pra beijar eles”, disse o pai do Miguel.
Na casa que alugou em São Paulo, a batalha de Meire e Miguel atraiu uma legião de admiradores.
Eles tiveram apoio de anjos da guarda, como a tia emocionada.
“Ver ele no parque, interagindo com outras crianças, é emoção demais”, disse a dona de casa Marlívia Carvalho, tia de Miguel.
Um final feliz, um senhor exemplo de força e amor.
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